O fenômeno da decoada no Pantanal passou a ser registrado em áreas mais próximas de Corumbá a partir do final de abril de 2023 e começo de maio de 2023. Na última semana de abril, houve registros na região de Porto da Manga, que tem influências do rio Paraguai e do rio Miranda.
O biólogo e integrante da equipe de monitoramento do programa Cabeceiras do Pantanal, Sérgio Barreto, explica como se dá esse fenômeno natural. “A decoada é um fenômeno natural que ocorre quando as águas dos rios do Pantanal extravasam para as áreas da planície que secaram durante a estação seca e agora, na estação chuvosa, estão com muita vegetação e matéria orgânica. O momento é marcado pela diminuição do nível de oxigênio na água por conta da decomposição dessa vegetação durante esse período de cheia dos rios e alagamento da planície.”
Também membro da equipe de monitoramento do Cabeceiras do Pantanal, o biólogo Wener Hugo Arruda Moreno acrescenta que um dos primeiros peixes a dar indícios de surgimento da decoada é a raia. Quando ela passa ser vista com mais intensidade nas margens dos rios, é indicativo do fenômeno estar em curso. Existe também uma preocupação em termos de ferimentos, pois esse peixe tem uma cauda com espinho.
Conforme Álvaro Nunes, em publicação feita no site da Embrapa, a raia ocorre nos rios, vazantes, corixos e baías do Pantanal. Alimentam-se de pequenos peixes, crustáceos e moluscos. A raia apresenta fecundação interna e é vivípara; os filhotes já nascem formados. Como característica especial, apresenta um espinho com veneno na região caudal. Existem 3 espécies de raias no Pantanal. É crença popular que se devem arrastar os pés ao entrar em rios e corixos do Pantanal, para que tal movimento afugente as raias e evite as picadas, extremamente dolorosas. A Embrapa tem uma série de estudos sobre o fenômeno, esse trabalho pode ser acessado aqui.
“A raia é o primeiro peixe a boiar no rio Paraguai por conta do fenômeno da decoada” esclarece Wener Hugo.
Wilson Malheiros, gestor de manutenção na Rede de Proteção e Conservação da Serra do Amolar (Rede Amolar) pelo IHP, identifica que o fenômeno no Alto Pantanal passou a ser notado por comunidades ribeirinhas em meados de abril de 2023. Quando a cheia está maior no bioma, há registros de decoada a partir de março. A retomada de peixes onde ocorre o fenômeno costuma demorar o período de até 30 dias após os primeiros registros.
“Aqui na região da Barra do São Lourenço, Amolar, no Alto Pantanal, a decoada não foi percebida com intensidade, como já ocorreu em anos anteriores. Neste ano, foi mais fraca nessa área e afetou mais os peixes menores. Pela percepção que tivemos, foram poucos registros de pacu, pintado sendo afetados na margem do rio. Já com relação aos armal, roque-roque, traíra, foi notado que foram mais afetados. Porém, agora no começo de maio, a água já está limpando”, detalha Malheiros, que vive na região da Serra do Amolar.
Ele ainda pontua que condições específicas da região do Alto Pantanal, onde há uma área grande de conservação por conta do corredor de biodiversidade formado pela Rede Amolar, favorece para serem formadas áreas de fuga para os peixes protegerem-se da decoada. “Aqui na Serra do Amolar temos a baía do Taquaral. Sempre quando bate a decoada, nesse período que há cheia, a baía tem um acesso por corixo, onde os peixes entram. Essa baía recebe uma grande quantidade de água limpa da morraria da Serra do Amolar, que tem diferentes córregos. “
Pesca proibida
O Comando da Polícia Militar Ambiental de Mato Grosso do Sul divulgou alerta que o pescado que esteja morrendo pelo fenômeno da decoada não pode ser capturado. Além disso, não se pode utilizar petrechos proibidos ou capturar pescado fora das medidas permitidas; bem como respeitar as cotas de captura para a pesca profissional e amadora.
A pesca em área de decoada é proibida por lei. A pena para pesca predatória é de prisão em flagrante e após julgamento o condenado pode ser sentenciado com um a três anos de detenção, além de ser obrigado a pagar multa administrativa que varia de R$ 700,00 a R$ 100 mil, mais R$ 10,00 por kg de pescado, bem como apreensão de barco, motor, veículo, e tudo que for utilizado no crime.
Sobre o IHP
O Instituto Homem Pantaneiro (IHP) é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos. Fundado em 2002, atua na conservação e preservação do bioma Pantanal e da cultura local. Entre as atividades desenvolvidas pela instituição destacam-se a gestão de áreas protegidas, o desenvolvimento e apoio a pesquisas científicas e a promoção de diálogo entre os atores com interesse na área.
Os programas que o Instituto atua são Rede Amolar, Cabeceiras do Pantanal, Amolar Experience, Felinos Pantaneiros, Memorial do Homem Pantaneiro, Brigada Alto Pantanal e Estratégias para Conservação da Natureza. Saiba mais em https://institutohomempantaneiro.org.br/.